Quando eu emagrecer...
- Juliana Graminho
- 2 de abr. de 2022
- 5 min de leitura
Atualizado: 20 de jun. de 2022
Muitas e muitas mulheres colocam o emagrecimento como condição para alcançarem a felicidade. É muito comum falarmos/ouvirmos frases como: "Quando eu emagrecer vou começar a sair mais, ou vou aprender a pedalar, ou vou me matricular numa dança que tenho vontade de fazer há muito tempo", ou ainda "Preciso emagrecer antes do casamento, ou para ir à praia, ou para procurar um novo trabalho", chegamos às vezes até a acreditar que é preciso emagrecer para encontrar um(a) companheiro(a).
E assim, muitas de nós ficam aprisionadas na crença de que é necessário primeiro emagrecer para depois (começar a) viver. E dessa forma, a vida vai aos poucos sendo mais e mais adiada. Ao ponto de algumas de nós deixarmos de sair de casa, por não aceitação do corpo. Algumas até deixam de procurar tratamento médico por receio de serem julgadas, ou tratadas indevidamente pelos profissionais da saúde (na chamada "gordofobia médica").
Sabemos que a insatisfação corporal está na raiz de muitos casos de Transtorno Alimentar, ou de um comer transtornado - então, precisamos refletir muito sobre isso.
Por que as pessoas (em especial as mulheres) estão tão insatisfeitas com o corpo? Por que a magreza acaba sendo vinculada a um ideal de felicidade e sucesso? É sobre isso que trataremos nesse texto.
Primeiro, convido a refletirmos sobre o que é tido como belo. Desde pequenas ouvimos comentários, elogios, críticas que vão nos mostrando o que é considerado belo e o que não é. Para se ter uma ideia, o que a humanidade entende como beleza vai mudando ao longo da história. O padrão de beleza, em cada época, mostra-se ligado a status ou interesses econômicos / políticos (muito além da estética).
Na Grécia Antiga, por exemplo, o padrão de beleza era magro e musculoso, era um corpo que deveria estar forte e apto para o combate bélico.
Com a vinda do cristianismo, a beleza física passou a ser abominada e entendida como fonte de pecado. O corpo então deveria ser escondido, e os desejos, proibidos.
Na Idade Média, o corpo deveria ser alto e forte para suportar o trabalho agrícola, devendo ser dominado e purificado por meio de punição (com intuito de salvar a alma).
No Renascimento até o ano de 1920, os corpos mais curvilíneos eram exaltados e buscados como ideal de beleza. A magreza era mais preocupante do que o excesso de peso. A magreza era associada à doença, miséria ou dificuldade - ao passo que ter um corpo gordo era sinal de saúde, fartura, privilégio apenas dos ricos.
Com o início da produção em série, que ganhou força na Revolução Industrial, os corpos passaram a ser tratados como meios de produção, necessitando ser controlados em termos de saúde, tempos, gestos e hábitos. Um corpo bom era um corpo com saúde capaz de suportar movimentos repetitivos da indústria.
Com início da era Moderna, ocorre a massificação da produção, do consumo e da comunicação. Os corpos então precisam cada vez mais reproduzir um padrão - o que acaba atendendo aos interesses econômicos e sendo bem lucrativo (fazer pouca variedade de tamanhos de roupa ou móveis na indústria, por exemplo, é mais rápido e requer menos esforço). Nessa época também, com a criação e popularização da fotografia, do cinema e da televisão - os corpos "modelo" passam a ser vistos com maior ênfase, exercendo maior pressão estética na população.
Agora no século XXI o padrão de beleza deixa de ser a beleza natural, e passa a ser uma beleza construída. Para Roger Scruton, há uma crença infundada de que mudando o corpo, é possível eliminar as insatisfações com a vida e mudar a própria existência. Diria mais: as pessoas por não terem êxito na mudança de suas vidas, acabam dirigindo as frustrações para o corpo na tentativa de mudá-lo ("como um problema substituto"). Ocorre assim a banalização da cirurgia estética (o Brasil disputa com os EUA, o primeiro lugar de país que mais realiza cirurgias estéticas no mundo), como se o corpo fosse algo simples de ser mudado. E muitas vezes, os procedimentos estéticos (cirúrgicos ou não) são vendidos pela propaganda como forma de mudar a vida.
Só que o corpo não é tão obediente assim. Fazer uma cirurgia estética, eleva nossa autoestima sim, mas não é capaz de curar uma compulsão alimentar por exemplo. O sujeito não sai da compulsão pela objetividade, pela racionalidade (ou seja, dando comando para o próprio cérebro de que deve parar de comer agora), apenas substitui uma paixão por outra.
Fica claro que o padrão de beleza é algo socialmente construído, com o intuito de favorecer certas camadas da sociedade. Por isso, é necessário que pensemos SE e POR QUE mesmo queremos emagrecer. Se for por pressão estética majoritariamente, sugiro avaliar melhor sua escolha. A quem você escolhe agradar: a SI mesma ou a quem tem interesses sócio-econômicos no seu emagrecimento.
Sabemos que é trabalhoso estar fora deste padrão, mas é tempo de cada uma de nós ocupar seu lugar legítimo no mundo, pois somos dignas dele. É nosso direito sermos respeitadas independente da forma de nossos corpos.
Algumas dicas de como estar mais em paz com o corpo (apesar de toda pressão estética vigente):

1. Ler textos como esse que mostram que os padrões estéticos mudam conforme o tempo, e atendem - mais que nada - interesses econômicos
2. Escolher bem quem você segue nas redes sociais: prefira aqueles que ajudam você a estar em paz com o corpo, e evite aqueles perfis que fazem você se sentir mal por excesso de pressão estética (uma modelo com corpo ”ideal” acaba nos fazendo sentir mais mal do que incentivando nossa evolução)
3. Lembre-se que somos muito mais do que aparência física. Nosso verdadeiro valor como pessoas não se pode tocar ou ver.
4. Caso passe por bullying não se cale. Gordofobia é tipificado como crime de injúria, você pode buscar seus direitos. Muitas vezes constranger o abusador é a melhor forma de educá-lo.
5. Reflita sobre tudo que seu corpo lhe proporciona: sentir cheiros, gostos, toques, abraços. Trabalhar, ser mãe, namorar. O seu corpo é um maravilhoso veículo que te conecta à vida.
6. Faça psicoterapia: isso ajudará muito você ser mais compassiva consigo, e a conseguir abandonar esse “problema substituto” de odiar o corpo, para encarar e trabalhar questões mais profundas.
7. Procure participar de coletivos / grupos de mulheres que acolham estas questões de corpo, como grupos de positividade corporal ou anti-gordofobia. Representatividade importa!
8. E venha fazer o Programa Comer Consciente conosco ! :-)
Estas e muitas outras questões são abordadas no Programa Comer Consciente. Um trabalho terapêutico em grupo, que ajuda mulheres a fazerem as pazes com a comida e com seu corpo (seja para aceitar-se como são ou buscar emagrecimento).
Até breve!
Juliana Graminho Psicóloga e Mentora do
Programa Comer Consciente
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