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O que há por trás da compulsão alimentar

  • Foto do escritor: Juliana Graminho
    Juliana Graminho
  • 1 de mai.
  • 4 min de leitura

A compulsão alimentar é frequentemente tratada como um problema de comportamento: um excesso de vontade, uma fraqueza de caráter ou, na melhor das hipóteses, uma "falta de estratégia".


É nesse ponto que muitas abordagens se concentram, como as técnicas da autoajuda ou da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC). Ambas apostam na ideia de que mudar pensamentos ou construir novos hábitos seja suficiente para resolver o problema. Mas quem já tentou parar de comer compulsivamente usando apenas “força de vontade”, frases motivacionais ou diários de controle alimentar sabe: algo mais profundo está em jogo.


A psicanálise oferece um olhar radicalmente diferente e, sobretudo, mais humano. Para Freud, os sintomas — como o comer compulsivo — não são simplesmente disfunções a serem corrigidas, mas manifestações do inconsciente. Um sintoma não é um erro, mas uma mensagem. Nesse sentido, a compulsão alimentar pode ser entendida como o retorno do (conteúdo) recalcado: desejos, angústias, traumas e afetos que foram empurrados para fora da consciência, mas que, não podendo ser eliminados, retornam sob outra forma — neste caso, como um descontrole alimentar.

A compulsão alimentar é como se o corpo falasse o que a boca calou. Aquilo que não teve lugar simbólico — não foi nomeado, elaborado ou escutado — reaparece no ato de comer sem fome, de buscar preenchimento onde só há vazio.



Muitas pessoas relatam que a compulsão vem “do nada”, ou que surge após períodos de autocontrole rígido. Isso não é coincidência. O recalque, como mecanismo psíquico, produz justamente esse tipo de fenômeno: quando o sujeito tenta silenciar um sofrimento emocional profundo (como tristeza, raiva, culpa ou abandono), ele pode retornar na forma de um sintoma corporal (obesidade por exemplo) ou comportamental, como o comer excessivo.



Por que autoajuda, coaching de emagrecimento e TCC nem sempre funcionam?


A autoajuda costuma oferecer soluções rápidas e superficiais. Frases como “basta mudar seu mindset” ou “você só precisa de mais disciplina” desconsideram as camadas inconscientes que sustentam o sofrimento. Elas reforçam a ideia de que a pessoa está errada ou falhando por não conseguir se controlar — o que, na verdade, apenas agrava a culpa e o ciclo de compulsão.


Já a Terapia Cognitivo-Comportamental, embora eficaz para muitos quadros clínicos e validada cientificamente em vários contextos, pode se mostrar limitada nos casos de transtornos alimentares complexos. Isso porque ela atua principalmente no plano racional, enquanto a compulsão se origina em processos inconscientes, afetivos e muitas vezes simbólicos, que escapam à lógica do pensamento consciente.


Como afirma o psicanalista Darian Leader em seu livro Comer, se alimentar, engolir, a alimentação desregulada não é apenas uma questão de nutrição ou comportamento, mas uma linguagem do sujeito. Ele propõe que, para entender o comer compulsivo, é preciso escutar o que está sendo comunicado por meio da comida.



A escuta psicanalítica como ferramenta de transformação


A psicanálise, ao invés de oferecer fórmulas prontas ou exercícios, propõe uma escuta profunda e singular. O analista não busca corrigir o comportamento, mas compreender junto com o paciente o que há por trás dele. O tratamento permite que o sujeito fale — talvez pela primeira vez — sobre dores, faltas, desejos e conflitos que estiveram por trás do sintoma. O comer compulsivo deixa de ser um "inimigo" e passa a ser um enigma a ser escutado… e decifrado.


Estudos mostram que a psicanálise pode produzir efeitos terapêuticos duradouros. Uma metanálise publicada no American Journal of Psychiatry (Shedler, 2010) indica que terapias baseadas na psicanálise têm impacto significativo, inclusive maior do que muitas abordagens focadas apenas no alívio sintomático, com benefícios que continuam a crescer mesmo após o fim do tratamento.



Conclusão


A compulsão alimentar não é um problema de força de vontade, mas uma forma de expressão do inconsciente. Enquanto estratégias de autoajuda, coaching e métodos cognitivos tentam “silenciar” o sintoma, a psicanálise convida a escutá-lo. Nesse processo, o sujeito deixa de ser culpado por seu sofrimento e passa a ser agente de sua própria história. Porque, afinal, não se cura uma dor psíquica com frases prontas — cura-se com escuta, com palavra, com tempo. E com a coragem de olhar para o que foi recalcado, mas insiste em retornar.


Se você sente que já tentou de tudo para controlar a alimentação e ainda assim se vê presa(o) em ciclos de culpa, restrição e descontrole, talvez seja hora de mudar a pergunta: em vez de “como parar de comer?”, que tal se perguntar “o que essa fome está tentando me dizer?”. A psicanálise oferece um espaço seguro para escutar essa mensagem oculta, acessar o que foi recalcado e, assim, transformar o sintoma. Iniciar esse processo é mais do que tratar um transtorno alimentar — é um caminho de reencontro com sua história, com seu desejo e com uma relação mais livre com o próprio corpo. Se essa ideia ressoou em você, talvez seja o momento de começar sua escuta.


Preenchendo o questionário no link você começa a refletir sobre os gatilhos que estão desencadeando seu comer emocional e exagerado… e assim começa uma jornada de emagrecimento diferente



beijos e até a próxima


Juliana Graminho

Psicóloga

Comer Consciente


Fontes:

  1. DAMAS, P. C. et al. Por uma compreensão psicanalítica da compulsão alimentar. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, São Paulo, v. 16, n. 1, p. 135-151, mar. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rlpf/a/ySZ5DqSd8cwZqcvSSmNcBQC/?lang=pt. Acesso em: 1 maio 2025.

  2. LIMA, A. C.; COSTA, A. M. Compulsão alimentar e compulsão à repetição: contribuições da psicanálise à compreensão do comer compulsivo. Revista Contemporânea, Salvador, v. 13, n. 28, p. 223-240, 2018. Disponível em: https://ojs.revistacontemporanea.com/ojs/index.php/home/article/download/6824/4860/19854. Acesso em: 1 maio 2025.

  3. MELO, A. G.; MACHADO, M. C. S. Seria a comida um objeto tóxico? A clínica da compulsão alimentar e da obesidade a partir das toxicomanias. Revista Subjetividades, Fortaleza, v. 18, n. 1, p. 75-88, 2018. Disponível em: https://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S2176-48912018000100009&script=sci_arttext. Acesso em: 1 maio 2025.

ARTIGOS INTERNACIONAIS COMPROVANDO EFICÁCIA DA PSICANÁLISE:

  1. SHEDLER, J. The efficacy of psychodynamic psychotherapy. American Psychologist, Washington, v. 65, n. 2, p. 98-109, 2010. Disponível em: https://www.apa.org/pubs/journals/releases/amp-65-2-98.pdf. Acesso em: 1 maio 2025.

  2. STEINERT, C. et al. Psychodynamic therapy: as efficacious as other empirically supported treatments? A meta-analysis testing equivalence of outcomes. American Journal of Psychiatry, Washington, v. 174, n. 10, p. 943-953, 2017. Disponível em: https://psychiatryonline.org/doi/10.1176/appi.ajp.2017.17010057. Acesso em: 1 maio 2025.

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